terça-feira, 16 de setembro de 2008

Something Else - Parte 1

Ela tinha nove anos de idade quando perdeu o pai. Muito confusa, não sabia por onde começar a nova vida que se abria aos seus olhos. A mãe, muito alterada com a morte de seu marido, preferiu deixar a menina aos cuidados da tia. Talvez ela fosse se perder se estivesse aqui com ela. Todo o sofrimento que a mãe achou que a filha não sentia, ela sentiu. O distanciamento da mãe só piorou a vida da pequena menina, que agora se sentia desamparada e infeliz, sem os pais, sem a casa, sem o cachorro, sem nada.
Buscou a ajuda da tia, mas recebeu em troca indiferença. A tia, que já tinha seis filhos pra criar, atendeu ao pedido da irmã, mas pouco fazia para tornar a criança parte da família. Os primos, todos homens, abusaram um a um da menina, de todas as formas possíveis. Alguns verbalmente, sendo esses mais novos. Outros sexualmente, os mais velhos. A menina foi de encontro a um mundo novo e cheio de amargura. Fechou-se a tudo e a todos. Até que um dia o seu tio deu uma atenção a ela. Escutou o poema que ela fez para a escola. A menina, ao ler o poema, chorou todas as mágoas que guardava desde o dia da morte de seu pai. O tio, mais velho, mais sábio, mais sensível, notou tudo que se passava naquela mente dolorida de criança sem cuidados. Passou então a dar uma maior atenção à família, em especial à sobrinha, que se tornava sua companheira em leituras e filmes que os meninos não se interessavam. Um dia, não tão belo assim, encontrou a menina aos prantos na escada da varanda, a muito custo, conseguiu que ela desabafasse o que ele mais temia, ela contou que um dos gêmeos, o filho mais velho do casal, tinha molestado a menina na frente de uns amigos, que ao verem a cena, aproveitaram a janela para também aproveitar-se da menina. Ela foi molestada a tarde inteira, por cinco meninos de 17 anos, ela então tinha 13. O tio, solidário a dor da menina, pôs o filho mais velho para fora de casa – a contragosto da mulher, que acusou a sobrinha de seduzir o filho inocente e se insinuar descaradamente – e convocou uma reunião em família para fazer alguns poucos comunicados.
- Soube do que está se passando nesta casa. Ana é prima de vocês, merece respeito, carinho e atenção – olhou para a esposa ao proferir a ultima palavra – Se mais alguém nesta casa abusar, de qualquer forma e maneira, de Ana, terá que se ver comigo.
Ana, cada vez mais envergonha e alheia à família, recolhia-se ao canto da sala, querendo tornar-se parte da decoração, um objeto inanimado como no livro que seu tio leu na semana anterior, sumir no tempo, desaparecer por completo desta vida que ela não havia solicitado.


TO BE CONTINUED...